terça-feira, fevereiro 25, 2014
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Não há como reduzir "Ela", de Spike Jonze, a uma classificação (romance, drama, sci-fi), tampouco escolher uma de suas falas ou cenas para sintetizar toda a complexidade do roteiro, mas uma das falas do filme, dita por Rooney Mara numa breve (mas forte) participação como a ex-mulher do protagonista, me chamou a atenção: "Você sempre quis ter uma esposa sem ter os desafios de lidar com algo real". É a partir desta alfinetada que percebemos que Theodore Twombly, o personagem interpretado com maestria e sutileza por um Joaquin Phoenix que se apaixona por um sistema operacional, não é apenas um homem sensível, romântico e ferido, mas alguém covarde e egoísta. E isso não o torna um personagem odiável; na verdade, o torna mais humano, complexo e mais parecido conosco. Theodore prefere as conveniências da tecnologia para viver sua vontade de amor romântico, pois assim não há cobranças e as complicações das reais relações humanas inexistem (o roteiro de Jonze sugere que ele não soube lidar com a depressão da ex-esposa, enchendo-a de antidepressivos), e sofre quando Samantha, o sistema operacional que tem a voz aveludada da Scalett Johanson, começa a desenvolver uma personalidade própria. Assim como Tom Hansen, o personagem de Joseph Gordon-Levitt em "500 dias com ela" - outra pessoa cujo emprego era escrever mensagens para quem não conseguia se expressar -, na busca pelo amor, ele precisa superar o próprio ego.
Mas o roteiro de "Ela" é muito mais que isso. Uma variedade de temas é abordada (a solidão, a convivência com as novas tecnologias, o amor e as relações humanas na era virtual, o que é real e o que é irreal na modernidade) com enorme naturalidade e fluidez. (Muitos destes questionamentos também presentes em "Lost in translation", de 2003; há quem insinue que o filme de Spike Jonze seja uma espécie de resposta ao de Sofia Coppola em virtude do relacionamento entre os dois diretores.) As aparentes excentricidades do roteiro - como a facilidade com que os personagens aceitam o relacionamento entre Theo e Samantha - fazem com que achemos tudo muito irreal; mas os dramas vividos por Joaquin Phoenix e Scalett Johanson são tão reais e palpáveis, que chegamos a nos perguntar; será que a sociedade imaginada em "Ela", com sua fixação pelo virtual e por emoções superficiais, é realmente tão distante e fictícia?
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Caramba, quanto tempo desde as últimas postagens! E aí, tá pronto para voltar com força total?
ResponderExcluirGostei das suas impressões e fiquei curiosa. Vou preparar meu pen-drive para você me passar uns filmes assim: dignos de se ver.
Abraço!