Num relacionamento, mesma coisa. Há um discreto charme burguês em não se importar muito, em não se mostrar completamente disponível. Freud deve ter falado sobre isso em algum livro que não li; nós evitamos ao máximo ser a pessoa que se entrega totalmente, ao passo que temos dificuldade em lidar com quem nos ama sem moderação. Na verdade, nós calejamos para viver qualquer coisa que exija falta de fronteiras.
Acho que tem muito mais coisa envolvida nisto que o fator social. Há, nisso de valorizar o descaso do outro e de si, certo instinto aguçado de autopreservação. Shakespeare e a indústria pop podem nos ter ensinado o amor romântico, mas não conseguiram nos libertar do medo de sofrer numa relação a dois (ou a três, ou a quatro, quem sou eu para limitar); como nos doar integralmente ao mesmo sentimento que matou Julieta, Desdêmona e Marilyn Monroe? Ninguém quer baixar todas as guardas, expôr todas as fraquezas. Porque é isso que acontece quando admitimos que -- sim, nos importamos muito, não somos e nunca seremos tão blasé quanto ambicionamos ser.
Aqui cabe a autocrítica. Também sou desonesto com as pessoas e comigo mesmo; também finjo não me importar com coisas que na verdade me são caríssimas, apenas para me manter numa posição confortável em alguma situação. Claro, devo ser parte da geração mais covarde e não fujo muito do estereótipo dela. Mas nem por isso deixo de me perguntar: qual a hora de abandonar o medo da sinceridade e os comportamentos fingidos? Quando seremos reais?
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